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Foto do escritorCarlos Felipe

Relato de um ex-médico feliz

Atualizado: 2 de mai.


Fazia muito tempo que não me sentia assim. Frio na barriga, cabeça a mil. Acordo antes do sol sequer pensar em nascer. Mais um dia. Tomo meu banho, um café rápido. Já estou atrasado. Chegando lá, aquele desânimo de sempre toma conta de mim. Paro na porta, inspiro. Abro. Há gente pra todos os lados, correndo e falando de forma ininteligível. Todos de verde. Me dirijo ao vestiário, pego o meu pijama. A lista é infinita, uma bíblia de HMA’s e QP”s onde as páginas se alternam entre síndrome gripal, HAS descontrolada e algum quadro que eu deveria saber, mas não me lembro muito bem agora. Na verdade, eu me lembro muito pouco das coisas. É tanta correria que me esqueci que hoje ainda era quinta. Dor nas costas, fadiga, cervical travada. Esse foi o único caso que eu ainda não consegui resolver. Tenho deixado pra depois desde que me formei, sempre chega alguém mais importante primeiro. Pelo menos os boletos estão em dia, né? Quase isso. Mais um de 36 e fica no zero a zero. Tão pagando bem no noturno do PA.


Os anos vão passando, e essa quinta feira ainda não acabou. Vou percebendo que, pouco a pouco, os meninos estão crescendo. Logo mais o meu recém-nascido faz 3 anos. Parece que foi ontem! É, acho que realmente foi. Não sei precisar muito bem. Os amigos vão sumindo. Sempre em busca do papel mais valioso do estado: dinheiro. Vão se guiando e direcionando cada vez mais longe, dizem que quanto mais longe mais você recebe. Deve ser verdade, eu não costumo viajar muito. Os que ficam costumam estar sempre na mesma posição, a vida toda. O pediatra fica na sala 12, sentado com as pernas cruzadas na cadeira, levemente inclinada para a porta. O otorrino fica com aquelas luzes na cabeça, sempre de pé fazendo oroscopia e avaliando placas. O mais engraçado é o cirurgião, que sempre diz que vai durar só duas horinhas mas pelos meus cálculos já está lá, parado, há pelo menos 4 anos e meio. No mesmo lugar.

O meu corpo não aguenta mais. A minha mente não aguenta mais. E eu não sei mais o que fazer. Foi então que um dia, por acaso, comecei a perceber o sutil brilho de uma saída que se desvelava à minha frente. O verde pastoso do meu pijama de hospital já não era mais o único horizonte disponível. Uma paleta vibrante de possibilidades diferentes começou a pintar o quadro da minha vida.


Subitamente, senti-me livre para explorar um mundo que eu pouco conhecia, mas que me prometia maravilhas - muito maiores do que jamais imaginei. Saí do eco dos corredores de azulejos brancos para um espaço onde a luz do dia podia realmente me alcançar. Onde meu coração batia no ritmo de novas descobertas, não no tic-tac de um bip que explodiria a qualquer momento.


Me desfiz das correntes que me prendiam ao chão frio do hospital e dei um salto rumo ao desconhecido. Uma vez lá, descobri um universo novo, de aprendizado contínuo, de desafios diários e de vitórias sinceras que despertavam o mais profundo do meu ser.


Minhas mãos, que antes seguravam o estetoscópio e anotavam às pressas sintomas e sinais, agora eram ferramentas para trilhar um novo caminho. Passaram a criar conexões, tecer narrativas, desenhar novos horizontes para pessoas como eu.


Hoje, o som da minha respiração, tranquila e serena, preenche a sala. Sinto a brisa suave vinda da janela aberta, enquanto a luz do sol banha meu novo ambiente de trabalho, repleto de esperança e oportunidades.


Hoje, eu não consigo mais ir ao hospital. Me dá calafrios. Aquelas luzes, o ar de que há algo errado... No fim, uns se tornam cadeira, outros capote. Alguns, história. Agora sou eu quem tem medo de médico. Mas descobri que há muito mais além do que eu podia ver. Resolvi o único caso que me faltava - e que sem eu saber, era o mais importante.


Hoje eu sou feliz.





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