A infecção intra-amniótica, também conhecida como corioamnionite, é uma infecção que ocorre nas membranas que envolvem o feto, no líquido amniótico e, em alguns casos, no próprio feto.
Essa infecção é uma complicação significativa em obstetrícia, associada a morbidade e mortalidade tanto materna quanto neonatal, e ocorre principalmente em gestações de termo ou pré-termo com ruptura prolongada de membranas.
Abaixo, exploramos a fisiopatologia, os fatores de risco, e os critérios de diagnóstico dessa condição.
1. O que é a infecção Intra-amniótica?
A infecção intra-amniótica é uma condição inflamatória que envolve as membranas fetais (cório e âmnio), o líquido amniótico e, em casos mais graves, o próprio feto.
A infecção geralmente ocorre devido à invasão bacteriana ascendente do trato genital inferior da mãe, que alcança o ambiente intrauterino e causa uma resposta inflamatória. A condição também é chamada de corioamnionite.
Classificação
A infecção intra-amniótica pode ser classificada em:
Infecção clínica: Detectada por sinais clínicos, como febre materna e dor uterina.
Infecção subclínica: Não apresenta sintomas, mas é diagnosticada por exames microbiológicos ou bioquímicos do líquido amniótico.
2. Fatores de risco
Alguns fatores aumentam a suscetibilidade de uma gestante desenvolver infecção intra-amniótica.
Esses incluem:
Ruptura prematura de membranas (RPM): Ruptura prolongada antes do início do trabalho de parto, que aumenta o risco de infecção por facilitar a entrada de bactérias.
Parto prolongado: Exposição prolongada a toques vaginais, sondagens e outros procedimentos invasivos aumenta a probabilidade de infecção.
Exames vaginais repetidos durante o trabalho de parto (>5 a 6 vezes), que facilitam a introdução de agentes infecciosos no canal de parto.
Infecções do trato genital inferior, como vaginose bacteriana e infecções sexualmente transmissíveis, que podem ascender para o ambiente intrauterino.
Parto pré-termo: Gestações que ocorrem antes de 37 semanas estão em maior risco de infecção intra-amniótica devido à imaturidade das barreiras protetoras do útero.
Outros fatores adicionais
Procedimentos invasivos como amniocentese
Gestantes com histórico de infecção urinária durante a gravidez
Comorbidades, como diabetes, que aumentam a suscetibilidade a infecções
3. Fisiopatologia
A infecção intra-amniótica ocorre principalmente devido à invasão de microrganismos pelo trato genital inferior. A barreira mucosa cervical, o tampão de muco, geralmente impede que bactérias subam pelo canal cervical.
No entanto, em condições como RPM, essa barreira é rompida, permitindo que agentes patogênicos ascendam ao útero.
Os principais agentes causadores incluem:
Escherichia coli
Estreptococo do Grupo B (GBS)
Mycoplasma hominis e Ureaplasma urealyticum
Quando a infecção se instala, o corpo materno responde com uma inflamação local, que pode levar à liberação de prostaglandinas, desencadeando trabalho de parto prematuro e alterações nos tecidos.
4. Manifestações clínicas
A infecção intra-amniótica apresenta uma série de sinais e sintomas que ajudam a definir o diagnóstico. Os principais incluem:
Febre materna: A febre, geralmente acima de 38°C, é o sintoma mais comum e significativo.
Taquicardia materna: Frequência cardíaca materna acima de 100 bpm.
Taquicardia fetal: Frequência cardíaca fetal acima de 160 bpm, indicando sofrimento fetal.
Sensibilidade uterina: A paciente apresenta dor ou desconforto quando o útero é palpado.
Secreção vaginal purulenta ou fétida: Sugere presença de infecção bacteriana.
Esses sintomas, especialmente febre e taquicardia fetal, devem ser monitorados de perto para um diagnóstico preciso e oportuno.
A infecção intra-aminiótica pode acometer até 10% das gestações, abrange cerca de 40% dos casos de síndromes febris manifestadas durante o trabalho de parto e relaciona-se a 50% dos partos antes da 30ª semana de gestação.
5. Diagnóstico
O diagnóstico de infecção intra-amniótica pode ser clínico, mas há exames adicionais que ajudam na confirmação e fornecem informações sobre o estado da infecção.
5.1 Critérios clínicos de diagnóstico
Os critérios clínicos para diagnóstico de infecção intra-amniótica incluem:
Febre materna ≥39°C em uma única medida, ou febre ≥38°C em duas medições consecutivas com intervalo de 30 minutos.
Dois ou mais dos seguintes sinais:
Taquicardia materna
Taquicardia fetal
Sensibilidade uterina à palpação
Corrimento vaginal fétido
Leucocitose com desvio s/ outro foco evidente
Esses critérios são fundamentais para o diagnóstico inicial e para iniciar intervenções rápidas.
5.2 Exames complementares
Alguns exames ajudam a confirmar o diagnóstico de infecção intra-amniótica:
Amniocentese: Coleta de líquido amniótico para exame bioquímico e cultura. A presença de glicose reduzida e aumento de interleucina-6 (IL-6) são indicadores de infecção.
Hemograma completo: Aumento de leucócitos (leucocitose) pode indicar infecção.
Cultura do líquido amniótico: Útil para identificação do agente patogênico e ajuste do tratamento antibiótico.
6. Complicações
A infecção intra-amniótica pode levar a uma série de complicações para mãe e feto:
6.1 Fetais
Sepse neonatal: Infecção generalizada no recém-nascido, que pode levar a complicações graves e até a óbito.
Prematuridade: A infecção induz o trabalho de parto prematuro, resultando em nascimento antes de 37 semanas e complicações associadas, como síndrome do desconforto respiratório.
Infecções congênitas: Meningite e pneumonia neonatais estão entre as complicações graves.
6.2 Maternas
Endometrite puerperal: Infecção do endométrio após o parto.
Sepse materna: Infecção grave e sistêmica que pode levar ao choque séptico.
Atonia uterina e hemorragia: A infecção compromete a contratilidade uterina, aumentando o risco de hemorragias pós-parto.
7. Manejo clínico
O manejo da infecção intra-amniótica inclui o uso de antibióticos e, em alguns casos, o parto imediato, especialmente se o feto está em sofrimento. Abaixo, detalhamos as abordagens de tratamento:
7.1 Antibioticoterapia
Antibióticos Intravenosos: Cefalosporinas, como a ceftriaxona, e aminoglicosídeos, como a gentamicina, são comumente utilizados.
Cobertura para Anaeróbios: A adição de clindamicina é recomendada, especialmente para cesarianas.
Posologia: Gentamicina 3 a 5mg/kg de 24/24 horas EV (dose máxima: 240mg) + Clindamicina 600mg de 6/6 horas ou 900mg de 8/8 horas EV.
OBS: Manter por até 48h após o desaparecimento da febre; Não é necessário o emprego de ATB por via oral.
Pacientes com insuficiência renal: substituir a Gentamicina por Ceftriaxona a 1 grama EV de 12/12h ou 2 gramas EV de 24/24h.
7.2 Considerações sobre o parto
Na presença de infecção intra-amniótica, a via de parto deve ser avaliada conforme o bem-estar fetal e a condição materna:
Indução do parto: Em gestações a termo com infecção, é preferível induzir o parto.
Cesárea: Indicada em casos de sofrimento fetal grave ou complicações maternas que impeçam o parto vaginal seguro.
8. Prevenção
A prevenção é uma etapa essencial para reduzir a incidência de infecção intra-amniótica. Entre as medidas profiláticas estão:
Redução da frequência de exames vaginais: Durante o trabalho de parto, reduzir os toques vaginais desnecessários ajuda a prevenir a ascensão bacteriana.
Profilaxia com antibióticos em RPM: A profilaxia com antibióticos é recomendada em casos de ruptura de membranas prolongada, principalmente em mulheres em trabalho de parto prematuro.
Tratamento de infecções genitais: O tratamento de infecções vaginais e cervicais na gestação reduz o risco de ascensão bacteriana.
A infecção intra-amniótica é uma condição séria que exige identificação e tratamento rápidos para minimizar riscos para mãe e feto.
Com diagnóstico oportuno e intervenção adequada, é possível manejar a infecção intra-amniótica de forma eficaz, garantindo o melhor desfecho possível.